A médica Amanda Medeiros, com certificação internacional em medicina endocanabinoide, criticou a derrubada de perfis sobre cannabis medicinal no Instagram e classificou o caso como “um ato de censura que prejudica pacientes e profissionais da saúde”. Em entrevista ao Atento News, ela também manifestou apoio à Associação Santa Gaia, alvo de uma operação policial em Lins (SP), que resultou na apreensão de produtos medicinais e materiais de cultivo, no último dia 16 de outubro.
Assista à entrevista completa ao longo da reportagem.

“Perfis de médicos, pacientes e associações começaram a ser derrubados em massa. Entendemos isso como uma tentativa de censura, de impedir o debate sobre um tratamento que tem comprovação científica e traz alívio a milhares de pessoas”, afirmou Amanda.
Segundo a médica, a ação contra a Santa Gaia foi o estopim para a onda de suspensões. “Depois da operação, todo mundo que postava a favor da cannabis medicinal ou citava a associação teve os perfis apagados. Foram mais de cem em apenas um fim de semana”, disse.
Associação Santa Gaia se manifestou
Em nota oficial, publicada em seu site, a Associação Santa Gaia afirmou ter sido surpreendida pela ação de busca e apreensão determinada pela Justiça Estadual e destacou que atua legalmente no fornecimento de medicamentos à base de cannabis.
A entidade informou que mantém dois processos em curso que garantem sua atividade: um habeas corpus e uma ação cível no TRF1, em Brasília. “Não existe qualquer determinação judicial que obrigue a interrupção das atividades”, afirmou.
A Santa Gaia classificou o ocorrido como um “grave descompasso de informações” entre as esferas da Justiça e ressaltou a importância social do trabalho realizado. A associação atende mais de 9 mil pacientes em todo o país, entre eles crianças, idosos e pessoas com doenças como epilepsia, Parkinson, Alzheimer e câncer.
De acordo com o comunicado, 170 famílias recebem medicamentos gratuitamente, 97 pacientes são atendidos sem custo pela clínica social, e 53 colaboradores trabalham diariamente na produção e distribuição dos produtos. “Com a apreensão de todo o material, milhares de pacientes estão agora em risco, sem acesso às medicações que mantêm sua qualidade de vida”, destacou a entidade.
Em quais casos os medicamentos são usados
Durante a entrevista, a doutora Amanda explicou que os medicamentos à base de cannabis são utilizados principalmente em doenças que afetam o sistema nervoso central, como epilepsia refratária, autismo, esclerose múltipla, Parkinson e Alzheimer.

Segundo ela, os compostos da planta, como o canabidiol (CBD), não têm efeito curativo, mas agem como moduladores, ajudando a controlar sintomas e melhorar o bem-estar dos pacientes. “O canabidiol é um ansiolítico potente. Ele ajuda a diminuir a ansiedade, melhora o sono, reduz dores crônicas e traz mais qualidade de vida. É um tratamento sintomático que ajuda o paciente e toda a família”, explicou.
A médica ressaltou ainda que a cannabis medicinal não deve substituir outros tratamentos, mas atuar de forma complementar, com acompanhamento médico. “Não é a cura do mundo, mas pode ser o alívio que muitos precisam. A natureza é sábia e nos oferece alternativas importantes, desde que usadas com responsabilidade e orientação”, afirmou.
Como os medicamentos são adquiridos
A doutora Amanda também explicou que há três formas legais de adquirir medicamentos à base de cannabis no Brasil.
- A primeira é nas farmácias, onde já existem mais de 25 produtos registrados pela Anvisa. “Eles não ficam expostos nas prateleiras, mas se você perguntar para o farmacêutico, sempre tem o produto”, afirmou. No Brasil, os canabinoides, como o canabidiol (CBD), são vendidos apenas com receita médica. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) classifica esses produtos como controlados para uso medicinal.
- A segunda forma é por importação, autorizada pela Anvisa a partir de uma lista de empresas internacionais, principalmente dos Estados Unidos, Canadá e Europa — habilitadas a fornecer os produtos diretamente ao paciente.
- A terceira via é o atendimento por associações como a própria Santa Gaia, que distribuem o óleo medicinal a pacientes cadastrados e com prescrição. “Essas associações fazem o que o Estado ainda não faz: garantem o acesso de quem precisa. São entidades sérias, com acompanhamento técnico e social, que salvam vidas diariamente”, destacou Amanda.
“É saúde, não apologia”
Amanda também reforçou que o debate sobre o uso medicinal da cannabis deve ser tratado com seriedade e sem preconceitos. “Não é um tratamento para curar doenças, mas para aliviar sintomas e melhorar a qualidade de vida. Deixar de falar sobre isso é ruim para todos, porque já existe pouca informação chegando à população”, disse.
A médica ainda fez um alerta sobre a importância da informação antes da necessidade.
“Eu sempre digo às famílias: não esperem precisar de um tratamento à base de cannabis para apoiar o tema. É um medicamento que pode trazer alívio real a quem sofre. O conhecimento e o diálogo são essenciais para quebrar preconceitos e salvar vidas”, destacou.
Amanda também elogiou a atuação do ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) Paulo Teixeira, que cobrou explicações da Meta e ajudou a restabelecer parte dos perfis removidos. “A atitude do ministro foi fundamental. Ele expôs a gravidade da situação e pressionou a empresa a recuar”, afirmou.
Para a médica, o debate sobre a cannabis medicinal precisa ser visto como uma questão de saúde pública. “É um tratamento seguro, com resultados comprovados, que precisa ser discutido com maturidade e seriedade. Calar profissionais e pacientes é um retrocesso”, concluiu.
Por William Batista